De hoje (30) de março e 30 de maio de 2010, a Pizza do Babbo, em Pinheiros, São Paulo, ponto tradicional de encontro de desenhistas, vai se transformar na capital federal dos amigos do cartunista Glauco, assassinado em meados do mês de março deste ano. Durante a exposição “FALA, PANGA!”, 28 artistas, colegas ou pessoas que tiveram o trabalho diretamente influenciado pelo criador do personagem Geraldão, fazem uma sincera homenagem ao talento do cartunista. “Fala, Panga!” era a maneira como Glauco se dirigia aos amigos, especialmente os de redação.
Cada um dos artistas se apropria, a seu modo, do espírito anárquico de personagens como Dona Marta e Zé do Apocalipse para expressar seu carinho e admiração. Entre eles estão Pelicano, seu irmão e também cartunista, Caco Galhardo, Angeli, Adão Iturrusgarai, Luiz Gê, Jaguar, Ziraldo, Paulo Caruso, entre muito outros.
Glauco Vilas Boas é paranaense de Jandaia do Sul. Nasceu em 10 de março de 1957. Publicou sua primeira tira em 1976 no Diário da Manhã, de Ribeirão Preto. Foi premiado no Salão Internacional de Humor de Piracicaba e na 2ª Bienal de Humorismo Y Gráfica de Cuba. Começou a colaborar na Folha de S.Paulo em 1979. Editou pela Circo Editorial entre 1987 e 1989 a revista Geraldão. Nesse período também foi colaborador das revistas Chiclete com Banana e Circo, da mesma editora. Foi também roteirista da TV Pirata e TV Colosso, da Rede Globo.
O cartunista é autor de uma família de tipos como Dona Marta, Zé do Apocalipse, Doy Jorge e Geraldinho. Glauco criou em maio de 2000 os personagens Ficadinha -publicada aos sábados- e Netão -publicado às terças e quintas. Nesses anos, as histórias transformaram-se, sintonizadas com mudanças de comportamento, modas e manias, mas Glauco continuou fiel ao seu traço único e desenha com nanquim no papel. Usava o computador só para colorir as tiras, depois de escanear seus desenhos. "Para meu tipo de desenho, só mesmo com a pena, que dá um traço peculiar", dizia. Ex-guitarrista, o pisciano Glauco também já inspirou personagens de outros cartunistas. Angeli baseou-se nele para criar o Rhalah Rikota, "na época em que o Glauco era seguidor do guru indiano Rajneesh", diz Angeli.
Artistas participantes:
Adão Iturrusgarai, Airon Alcy, Allan Sieber, Angeli, Arnaldo Branco, Benett, Chiquinha, André Dahmer, Dálcio, Emílio Damiani, Galvão, Luiz Gê, Fernando Gonsales, Gustavo Duarte, Jaguar, Jean, Leonardo, Mariza, Nani, Orlando, Paulo Caruso, Pelicano, Solda, Spacca, Tiago Recchia, Ziraldo.
Texto do curador da exposição, Orlando Pedroso
Dizem que para um avião cair, precisa haver a coincidência de pelo menos 5 erros. Parece ser também o caso da triste e violenta morte do cartunista Glauco e de seu filho Raoni ocorridas na semana passada. Não cabe a nós aqui, agora, listar quais os erros que culminaram nesse drama de tamanha proporção, nem buscar os culpados de mais uma tragédia como tantas que acompanhamos diariamente nos noticiários. Talvez este seja o momento de listarmos os acertos, especialmente porque foram conduzidos pelo talento e pela coragem. Uma coragem inconsciente, é verdade, mas ainda assim coragem. O Glauco não sabia fazer de outra forma porque era movido quase que instintivamente a agir e criar sem as amarras ou limitações sociais que norteiam o mundo adulto. Ele criava como se fosse uma criança e fazia assim porque era o que ele tinha que fazer.
Em 1978 eu estava terminando o colegial, era um aspirante a ilustrador, cartunista e acompanhava a segunda fase do Pasquim, a reforma gráfica do Jornal da Tarde e, claro, a página Vira-Lata publicada no suplemento Folhetim, da Folha de S.Paulo e editada pelo Angeli.Lá estavam, além do próprio Angeli, Laerte, Alcy, Nilson, Jotinha e outros que aproveitavam o início da abertura política para espinafrar o que ainda sobrava da ditadura militar.Era um humor pesado, rancoroso e engajado. Era.
Nesse ano surgiu nas páginas do Vira-Lata um outro desenho, um outro humor. Aliás, um humor engraçado, leve, cheio de movimento e delicadeza. Era o Glauco que trazia novos ares e um espírito que iria mudar de vez a forma de se trabalhar a charge e o cartum na imprensa brasileira. Esses cartuns não respeitavam nada. O preso passava o pé na bunda do guarda, a menina deixava escapar na mesa do almoço que fizera um aborto dias atrás ou que tinha vários namorados, o defensor do feminismo pedia para a namorada pagar a conta do restaurante e o guardinha de trânsito botava ordem no cruzamento onde havia uma passeata vindo de cada lado.O peso de se fazer uma charge desaparecia e se tornava algo prazeroso e divertido. De 79 a 81 tive o prazer de passar algumas madrugadas acompanhando o fechamento das edições do Folhetim na sala onde também estavam o Fortuna, Faustinho, Maringoni, Luiz Gê. Em 1983 ele passou a publicar o Geraldão na sessão de tiras do jornal. O primeiro de uma série memorável de personagens que passariam a fazer parte da história dos leitores da Folha assim como de milhares de jovens que passavam a consumir o novo quadrinho que surgia. Em 1985 voltei a encontrar o Glauco na redação. Pouco depois ele passaria a fazer as charges. "E aí, panga?" Era como ele chegava nos colegas antes de desfiar um rosário de piadas e expressões sempre particulares e muito engraçadas. Eram, muitas vezes ingênuas, quase infantís mas sempre imprevisíveis e, provavelmente, não há pessoa que tenha trabalhado ou convivido com ele que não tenha pelo menos uma dezena de pequenas histórias tendo o Glauco como personagem.Gênio, amigo, figurinha carimbada, nosso John Lennon, não importa. O que fica agora é sua obra, a capacidade de contar a mesma piada centenas de vezes e de ela ser sempre boa, o talento de ter conseguido empurrar ladeira abaixo velhos padrões de comportamento e de conseguir com seu traço econômico que nosso mundo, o dos leitores, se tornasse muito melhor.
Serviço:
PIZZA do BABOO
abertura hoje (3)0 de março de 2010 - a partir das 20h
até 30 de maio, de terça a domingo, das 18h às 23h30
Curadoria: Orlando Pedroso
R. Joaquim Antunes, 824
Pinheiros
Fones: (11)3064 8282 e 3082 9065
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